Introdução
Os tumores renais foram responsáveis por 73.820 casos e 14.770 mortes por câncer nos Estados Unidos no ano de 2019. Estima-se que representem 3,8% dos novos casos de câncer anualmente em todo mundo.
Tumor renal é duas a três vezes mais frequente em homens, sendo mais prevalente dos 50-70 anos de idade, com idade média de 64 anos ao diagnóstico.
O aumento na incidência (25%), nas últimas décadas, dos tumores renais se deve ao uso mais prevalente de ultrassonografia (USG) e de tomografia computadorizada (TC) para avaliação de uma variedade de queixas abdominais ou gastrintestinais. Tais tumores são conhecidos por incidentalomas renais e representam cerca de 48-64% de todos os tumores renais.
Os incidentalomas renais são lesões renais com sintomas indeterminados, pouco sintomáticos ou assintomáticos que foram detectados por exames de imagem (TC ou USG). Solicitados muitas vezes por causa de outros sintomas.
ANATOMIA DOS RINS
Os rins estão localizados na região posterior do abdome, atrás do peritônio, motivo pelo qual são chamados de órgãos retroperitoneais. Existe um rim em cada lado da coluna; o direito encontra-se logo abaixo do fígado e o esquerdo abaixo do baço. Superiormente aos rins encontramos a’ glândula suprarrenal.
Os rins estão aproximadamente no mesmo nível que as vértebras T12 a L4, sendo que o rim direito localiza-se um pouco mais inferiormente que o esquerdo. O polo superior de cada rim está encostado na décima primeira e décima segunda costelas e ambos encontram-se envoltos por um coxim de gordura, com finalidade de proteção mecânica.
No adulto o rim tem cerca de 11 a 13 cm de comprimento, 5 a 7,5 cm de largura, 2,5 a 3 cm de espessura, com aproximadamente 125 a 170 gramas no homem e 115 a 155 gramas na mulher.
Cada rim possui a forma de um grão de feijão com duas faces (anterior e posterior), duas bordas (medial e lateral) e dois polos ou extremidades (superior e inferior). Na borda medial encontra-se o hilo, por onde passam o ureter, artéria e veia renal, linfáticos e nervos. Os rins estão envolvidos em toda sua superfície por um tecido fibroso fino chamado cápsula renal. Ao redor do rim existe um acúmulo de tecido adiposo chamado gordura perirrenal, que por sua vez está envolvida por uma condensação de tecido conjuntivo, representando a fáscia de Gerota ou fáscia renal.
Os rins são irrigados pelas artérias renais, que se originam da aorta. Cada artéria renal divide-se no hilo em um ramo anterior e um ramo posterior e estes, por sua vez, dividem-se em várias artérias segmentares que irão irrigar vários segmentos do rim.
A drenagem venosa costuma seguir paralelamente o trajeto do sistema arterial.
FATORES DE RISCO PARA CÂNCER DE RIM
Os fatores de risco para os tumores renais não são bem definidos, mas o tabagismo está presente na maioria dos casos, duplicando as chances de desenvolvimento desse tumor.
Existem outros fatores de risco como obesidade, hipertensão arterial e exposição a substâncias como cádmio, derivados da gasolina e de chumbo, além de irradiações e terapêutica com estrogênios.
Câncer de rim pode ser esporádico (mais frequente) ou estar associado a fatores genético/hereditários (como doença de Von Hippel-Lindau e carcinoma renal hereditário), insuficiência renal crônica, doença renal cística adquirida e esclerose tuberosa. Estima-se que 4% dos tumores são hereditários, geralmente multifocais, bilaterais e ocorrem em pacientes mais jovens.
O gene VHL que causa a doença de Von Hippel-Lindau, é um gene supressor de tumor. Ele normalmente mantém as células em crescimento fora de controle. Alterações neste gene podem ser hereditárias. Quando o gene VHL sofre mutação, não é capaz de suprimir o crescimento anormal e fica suscetível a desenvolver o câncer de rim. Os genes ligados ao leiomioma hereditário e ao carcinoma de células renais (gene FH), síndrome de Birt-Hogg-Dube (gene FLCN) e ao câncer renal familiar (genes SDHB e SDHD) também são genes supressores de tumores, e as mutações hereditárias desses genes também aumentam o risco de câncer de rim.
Pessoas com carcinoma de células renais papilares hereditários herdam alterações no oncogene MET, que faz com que ele seja ligado o tempo todo. Isto pode levar a um crescimento celular descontrolado e torna a pessoa mais propensa a desenvolver o câncer de células renais papilar.
PREVENÇÃO DO CÂNCER DE RIM
Não fumar, manter um peso saudável por meio de exercícios físicos, ter uma dieta rica em frutas e vegetais, e fazer tratamento para hipertensão reduzem a probabilidade da doença.
Por fim, evitar a exposição ocupacional a substâncias sabidamente tóxicas, como cádmio, derivados da gasolina e de chumbo podem reduzir o risco em desenvolver um câncer de rim.
CLASSIFICAÇÃO PATOLÓGICA DOS TUMORES RENAIS
Aproximadamente 85% dos tumores renais são carcinomas, sendo o tipo histológico mais comum o Tumor tipo Células Claras com 70% dos casos, seguido pelos tumores papilares (cromofílicos, 10-15%), os cromófobos (4-5%), os tumores de ductos coletores (Bellini, 1%) e os sarcomatoides (1%).
QUADRO CLÍNICO DO CÂNCER DE RIM
A maioria dos tumores renais 48-64% são encontrados durante a realização de exames devido a queixas vagas gastrointestinais, normalmente são lesões menores que 4 cm, sendo conhecidos por Incidentalomas renais.
À medida que os tumores renais crescem eles podem causar sintomas. A apresentação clínica é variável. Sinais e sintomas mais comuns são hematúria, dor lombar ou no flanco e massa palpável, associados ou não a outros menos específicos, como emagrecimento, febre, sudorese noturna, hipertensão e varicocele.
Hematúria macro ou microscópica é o sinal urológico mais frequente, presente em 30 a 60% dos casos. Massa palpável no flanco e dor lombar aparecem isoladamente em cerca de um terço dos pacientes. A tríade clássica: dor lombar, hematúria e massa palpável no flanco é vista em menos de 10% dos casos. São muitas as manifestações possíveis decorrentes de metástases (em 20% dos casos ao diagnóstico) ou de síndromes paraneoplásicas (em 20% dos casos), incluindo febre, disfunção hepática, anemia, perda de peso, caquexia, hipercalcemia, eritrocitose e hipertensão arterial.
DIAGNÓSTICO
Durante a consulta o médico fará perguntas sobre seu histórico clínico, incluindo informações sobre os sintomas apresentados, possíveis fatores de risco, histórico familiar, e outras condições clínicas. Será realizado um exame físico completo, para determinar possíveis sinais da doença e de outros problemas de saúde.
Alguns possíveis sinais e sintomas de câncer de rim, porém não específicos, incluem sangue na urina, dor lombar de um lado, cansaço, perda de apetite, perda de peso e anemia.
Apresentação sintomática, perda de peso significativa (superior a 10% do peso corpóreo), dor óssea e performance status ruim sugerem doença avançada, assim como achados, ao exame físico, de massa palpável abdominal ou linfadenopatia. Varicocele não redutível e edema de membros inferiores sugerem envolvimento venoso.
A Ultrassonografia de vias urinárias (USG) é o método de imagem mais empregado para rastreamento de patologias renais. Seu papel principal consiste em detectar lesões parenquimatosas focais e classificá-las em três categorias: definitivamente cisto simples, definitivamente nódulo sólido ou natureza indeterminada.
Pacientes com massa renal suspeita ao ultrassom devem ser avaliados com tomografia computadorizada de abdome. Não está indicada biópsia de rotina para diagnóstico antes da cirurgia. A biópsia pode ser indicada nos casos de suspeita de linfoma renal, metástases de outras neoplasias e quando há lesões suspeitas bilaterais.
A Tomografia Computadorizada de Abdome total com contraste (TC) possibilita a diferenciação entre cistos e nódulos sólidos, além de estadiar e auxiliar na programação cirúrgica dos tumores renais. Ela fornece informações sobre extensão tumoral primária, envolvimento venoso, aumento de linfonodos locorregionais e condições das glândulas adrenais e do fígado, além da função e da morfologia do rim contralateral. Após diagnóstico de tumor renal devemos realizar Tomografia de Tórax para completar estadiamento, uma vez que é o principal sítio de metástase à distância.
A Ressonância Nuclear Magnética (RNM) pode ser utilizada como exame complementar à TC, além de ser o método de escolha para pacientes nefropatas crônicos ou com alergia ao contraste iodado. Melhor indicada para investigação de tumores com suspeita de invasão das veias renal e da cava inferior.
TRATAMENTO
Tratamento Cirúrgico:
Tumores localizados nos rins e sem metástases à distância a Nefrectomia parcial (poupadora de néfrons) é o tratamento de escolha. Devendo ser indicada e tentada sempre que possível. Principalmente em pacientes com tumores bilaterais, ou com insuficiência renal, ou com tumores com menos de 4 cm.
Nos casos em que a lesão neoplásica possui grandes dimensões (maiores que 7 cm) ou localização anatômica desfavorável, impossibilitando uma ressecção parcial, devemos realizar a nefrectomia radical, que é a retirada de todo rim envolto pela sua fáscia de Gerota e gordura perirrenal íntegras. Com ligadura de artéria e veia renais, associado a uma linfadenectomia regional.
A adrenalectomia (retirada da adrenal do mesmo lado) está indicada nos casos em que o tumor renal engloba o polo superior, bem como nos casos de invasão por contiguidade, sendo relativamente raro seu acometimento, apenas em 5% dos casos.
A linfadenectomia de retroperitônio (estendida) de gânglios não deve ser realizada de rotina, apenas se houver suspeita (gânglios suspeitos/aumentados de tamanho). A quimioterapia adjuvante (após a cirurgia) é indicada quando há acometimento linfonodal.
A via de acesso cirúrgica pode ser laparoscópica, robótica ou convencional. Possuindo resultados oncológicos semelhantes a depender da experiência pessoal da equipe cirúrgica com os 3 métodos. Devendo-se respeitar a indicação oncológica, pautando-se na preservação de parte funcionante renal, sempre que for tecnicamente factível. Deixando margens cirúrgicas livres de neoplasia residual. Para um mesmo caso de câncer renal é preferível fazer uma nefrectomia parcial laparoscópica com margens livres do que uma nefrectomia radical robótica.
Resultados oncológicos a longo prazo da nefrectomia laparoscópica são semelhantes aos da cirurgia aberta, com sobrevida livre de doença em cinco anos de 91% e de 87% para cirurgia aberta. Há sempre menor morbidade para casos operados por via laparoscópica, com menos tempo de hospitalização e retorno mais rápido às atividades, além de efeito cosmético superior (menores marcas de cicatrizes cirúrgicas).
Pacientes com tumor renal associado a trombo no interior da veia cava deverão ser submetidos à nefrectomia radical mais retirada do trombo, após controle vascular da veia cava e seus ramos. Cirurgia extremamente complexa e exige equipe cirúrgica, anestésica e de UTI experientes em cirurgias de grande porte. Considerar ressecção da veia cava se houver invasão tumoral da parede do vaso. Felizmente situação extremamente rara.
Tumores renais associados a metástases à distância ao diagnóstico, quer seja para pulmões, fígado, ossos ou linfonodos maciçamente devem ser analisados caso a caso em reunião multidisciplinar.
A Nefrectomia radical (cirurgia citorredutora) pode ser um tratamento inicial recomendado, nos casos em que há indicação de terapia complementar com quimioterapia/imunoterapia e ressecção de metástases, especialmente nos casos de lesões únicas ou exclusivamente pulmonares. Nos casos em que não há possibilidade de cirurgia citorredutora, mas indicação apenas de tratamento sistêmico, a biópsia deve ser indicada para o diagnóstico histológico.
Sempre que possível, as recidivas locais pós-nefrectomia deverão ser ressecadas, uma vez que, esses pacientes apresentam melhor prognóstico do que os não operados. Principalmente se menores de 5 cm, com margens cirúrgicas negativas e sem diferenciação sarcomatóide.
Tratamento Multidisciplinar:
Uma equipe multidisciplinar no tratamento do câncer é fundamental, tendo em vista que é um processo que passa por várias etapas, sendo que em cada uma delas é necessário o atendimento de um profissional de saúde especializado para prestar o melhor suporte possível.
Cada paciente reage de uma forma diferente, por isso, ter uma equipe multidisciplinar te prepara para atuar de forma humanizada em cada etapa. Assim, você terá uma abordagem mais ampla e eficiente, desde o diagnóstico até o pós-tratamento, fazendo com que cada membro tenha um papel importante no cuidado.
A abordagem completa do doente e seus familiares se torna mais simples quando submetida aos olhares de profissionais diferentes, já que o paciente pode necessitar da intervenção de várias especialidades, como neurologia ou medicina geral.
Sua importância está no fato de que promove um melhor atendimento aos enfermos e proporciona um atendimento centrados na necessidade de cada um, pois não se trata de um trabalho pré-organizado. As necessidades são identificadas e diagnosticadas, fazendo com que os profissionais se reúnam para buscar a recuperação da saúde e do bem-estar de quem está recebendo os cuidados.
Não existe uma conduta para todo mundo. Cada um tem uma necessidade diferente e merece cuidados diferentes:
Enfermeiro – É o profissional que está ao lado do paciente em todos os momentos e que orienta sobre os possíveis efeitos colaterais, sinais e sintomas e outras possíveis dúvidas que surjam durante o tratamento. O enfermeiro é quem dá as orientações sobre os cuidados e precauções gerais da colostomia.
Psicólogo – Sentimentos como depressão, ansiedade, medos, preocupações e dúvidas são comuns e muitas vezes, precisam de cuidado. O psico-oncologista apoia emocionalmente o paciente e seus familiares, proporcionando uma melhor qualidade de vida.
Nutricionista – É o profissional que pode ajudar a diminuir os efeitos colaterais do tratamento por meio de uma alimentação equilibrada e saudável. Em casos de colostomia, também são necessárias orientações sobre o que comer e o que deve ser evitado.
Fisioterapeuta – É responsável por promover a recuperação físico-funcional do paciente restaurando movimentos e funções comprometidas durante ou após a doença.
Tratamento Clínico
Para pacientes com possibilidade de acesso às novas drogas, o tratamento de escolha deve ser definido após diagnóstico histológico obtido por biópsia. Existem inúmeros trabalhos científicos estudando inúmeras drogas (sunitinibe, pazopanibe, tensirolimo, interferon, bevacizumabe dentre outras) para tratamento sistêmico do câncer renal.
Devendo o tratamento ser personalizado para cada caso e discutido em conjunto com a Oncologia Clínica a conduta.
PROGNÓSTICO E SEGUIMENTO
A evolução dessas neoplasias está relacionada a fatores tumorais e também às condições clínicas do paciente. O estádio patológico constitui o fator isolado mais importante e a sobrevida média em doença confinada aos rins (pT1-T2) é de 70-90% em cinco anos, com redução de 15-20% quando existe invasão da gordura perirrenal. E de 5-10% quando existe comprometimento linfonodal. Pacientes com doença metastática e em condições clínicas satisfatórias têm sobrevida média de 10 a 15 meses, enquanto aqueles em mau estado geral sobrevivem em torno de seis meses.
O Carcinoma renal pode, em qualquer estádio clínico inicial e tempo de evolução desde o diagnóstico, apresentar recidiva local ou à distância. Por esta razão, o seguimento clínico tem importância fundamental. E deve ser realizado pela equipe assistente com exames de imagem solicitados de acordo com cada caso.