O que é?
É o tumor maligno que cresce no interior da bexiga (órgão oco que armazena urina produzida por ambos os rins). O câncer de bexiga pode se apresentar como uma pequena lesão superficial, que cresce recobrindo o interior da bexiga, até grandes massas que invadem todas as camadas da bexiga e/ou outros órgãos. Mais comumente encontrado em idosos e expostos ao tabagismo, defensivos agrícolas e solventes químicos, dentre outros.
Fatores de Risco
O mais importante é o tabagismo, que ocorre em 70% dos casos, onde fumantes apresentam um risco entre 3 a 4 vezes maior que não fumantes. Este risco aumenta com o número de cigarros consumidos, duração do tabagismo e grau de inalação. Além disso, os demais fatores de risco são causados por atividades ocupacionais que exigem o contato com aminas aromáticas, anilinas, corantes, borracha, solventes, derivados do petróleo, além do uso de drogas como a fenacetina, ciclofosfamida e radioterapia.
A doença também pode ocorrer em portadores de infecção crônica do trato urinário, calculose ou corpo estranho vesical, cistite por Schistosoma hematobium, doenças congênitas como persistência do úraco e extrofia vesical, tumores em pelve e ureter.
Sintomas:
O sintoma mais frequente é a presença de sangramento visível na urina, denominada hematúria macroscópica, habitualmente vermelho vivo, podendo estar acompanhado de sangue coagulado. Mais raramente, este sangramento só poderá ser observado através de um exame de urina, sendo denominado hematúria microscópica (não visível ao olho humano).
Merecendo ser investigado por um uro-oncologista todo caso de hematúria em pacientes idosos e/ou com outros fatores de risco. Porém outras doenças como cálculos renais e vesicais, hiperplasia prostática benigna, infecções do trato urinário, tuberculose renal também podem cursar com hematúria.
Outros sintomas podem ocorrer em pacientes com câncer de bexiga, tais como: infecções urinárias de repetição, sintomas irritativos (urinar toda hora, levantar muitas vezes à noite), dificuldade e dor para urinar e dor abdominal nos casos mais avançados.
Diagnóstico:
Através da história clínica detalhada e do exame físico completo o médico poderá fazer a suspeita desta doença. Como a presença de sangramento na urina pode decorrer de outras doenças nos rins, nos sistemas coletores de urina (cálices e pelves renais), nas vias excretoras (ureteres) e na bexiga, o médico poderá solicitar alguns exames de imagem (ultrassonografia do sistema urinário, tomografia computadorizada de abdome total com contraste, ressonância nuclear magnética) para avaliar anatomicamente estas estruturas.
O exame diagnóstico mais importante e específico para os tumores vesicais é a endoscopia (cistoscopia), que permite ao médico visualizar o interior da bexiga com uma pequena ótica acoplada a uma câmera, que é introduzida pela uretra (canal da urina). Realizando-se biópsia da lesão suspeita quando indicado.
A cistoscopia pode ser realizada sem a necessidade de internação (hospital dia), utilizando leve sedação associada a anestesia local, através da introdução de uma geleia anestésica de xilocaína pela uretra. Faz o exame com ou sem a biópsia e quando acordar vai para casa com acompanhante dirigindo o carro, pelo risco de sonolência decorrente da sedação.
Estadiamento (TNM)
O Tumor vesical tem estadiamento clínico a depender do Tamanho tumor (T), Presença de Linfonodos suspeitos (N) e Presença de Metástases à distância (M) baseados em exames de imagem, solicitados previamente ao tratamento.
Tratamentos
O tumor de bexiga, assim como todos tumores, deve ser tratado por equipe experiente e com grande número de cirurgias realizadas. O que impacta muito no prognóstico (possibilidade de cura), porcentagem de recorrência da doença na bexiga e à distância (metástases).
O tratamento dependerá do Estadiamento Clínico com exames de imagem (Ressonância Nuclear Magnética e Tomografias Computadorizadas) e Estadiamento Patológico com análise do material obtido pela “cirurgia de raspagem” do tumor.
Através de exames radiológicos realizados antes da cirurgia, o médico verificará o tamanho do tumor na bexiga e eventual comprometimento de outras estruturas no organismo, especialmente dos pulmões, fígado e gânglios linfáticos (linfonodos) localizados dentro da cavidade abdominal. Todas estas informações constituem o estadiamento clínico do tumor e juntamente com estadiamento patológico (pós-operatório) definirão a forma mais adequada de tratamento, assim como o prognóstico.
Quando exames de imagem para investigação de hematúria diagnosticam um tumor vesical, já haverá a necessidade da realização de uma cirurgia de raspagem/ressecção do tumor por via uretral (RTU-v). Tal cirurgia normalmente é realizada com raquianestesia e há necessidade de internação hospitalar por 24-48 horas. Podendo uma prévia cistoscopia, apenas diagnóstica, ser dispensada em casos selecionados.
A Ressecção Transuretral do tumor vesical coletará tecido tumoral para análise das suas características microscópicas (estudo anatomopatológico), dados fundamentais para definição do prognóstico e tratamento complementar deste câncer de bexiga.
O estudo anatomopatológico permitirá ao médico patologista examinar as células tumorais e compará-las com as células normais do mesmo tecido. Observando o quanto essas tumorais diferem das normais e classificar o tumor em “baixo grau (de diferenciação)” e “alto grau”.
O grau tumoral reflete/estima a agressividade do tumor, ou seja, a probabilidade de vir a tornar-se infiltrativo (acometer mais profundo a bexiga), caso seja um tumor superficial e de se espalhar pelo organismo (desenvolver metástases para outros órgãos).
O patologista definirá também até que profundidade o tumor invadiu a bexiga, se comprometeu apenas a mucosa e submucosa (tumores superficiais), ou se já houve comprometimento da musculatura própria da bexiga (tumores infiltrativos).
Os tumores classificados, após análise do tecido ao microscópio, como Ta, Tis e T1 são considerados tumores superficiais. A maioria dos tumores Ta são tumores de baixo grau e raramente progridem para tumores infiltrativos. Contudo, costumam ser recorrentes. Os tumores estádio T1, por outro lado, com frequência podem evoluir com acometimento da musculatura vesical.
O estádio Tis caracteriza um tipo de tumor de alto grau denominado carcinoma “in situ” (CIS). Estes tumores são mais difíceis de serem removidos na sua totalidade, por muitas vezes não serem totalmente visíveis. Quando não tratados, acabam evoluindo para tumores infiltrativos.
Tratamento Tumores Superficiais
Após a raspagem e análise no microscópio, os tumores superficiais são estratificados de acordo com risco de recidiva e progressão da doença segundo a tabela abaixo:
Re-RTUv (segunda raspagem da bexiga) deve ser sempre considerada quando:
1- Na primeira cirurgia não houve retirada completa da lesão
2 – Não há amostra de musculatura detrusora (da bexiga) no material analisado
3 – Anatomopatológico com pT1 ou tumor com tamanho superior a 3,0 cm
4 – Anatomopatológico com carcinoma “in situ” ou de alto grau.
Devendo ser realizada 2-6 semanas após a primeira cirurgia, mostrando-se capaz de aumentar a sobrevida livre de recorrência e de aumentar taxa de cura desta terrível doença.
Em tumores de Baixo Risco o uso de dose única de Gemcitabina poderia diminuir recorrência.
O uso intravesical (na bexiga) de bacillus Calmette-Guérin (BCG) seriados após a RTU-v diminuiu a taxa de recorrência e progressão do câncer de bexiga de alto risco.
Esquema possível de Onco-BCG (intravesical)
• Fase de indução com Onco-BCG 40 mg diluídos em 100 ml de soro fisiológico, semanalmente por seis semanas consecutivas.
• Fase de Manutenção com Onco-BCG 40 mg diluídos em 100 ml de soro fisiológico, mensalmente no primeiro ano, trimestralmente no segundo ano e semestralmente até completar o terceiro ano.
Caso ocorra recidiva, o tratamento deve ser reiniciado após a ressecção de resgate. Uma segunda recidiva deve suspender a imunoterapia e caso rediscutido multidisciplinarmente.
Câncer de Bexiga Invasor e Cistectomia
Nos casos com tumores infiltrando musculatura da bexiga ou maiores (T2-T4) a cistectomia deve ser realizada até três meses após o diagnóstico. A cistectomia é a maior cirurgia da Uro-oncologia e a que tem as maiores taxas de complicações e morbidade. Devendo ser realizada por equipe experiente sempre.
No homem é indicada a cistoprostatectomia (retirada da próstata e da bexiga) e na mulher a exenteração pélvica anterior (retirada de bexiga, útero e anexos).
A linfadenectomia pélvica bilateral deve incluir gânglios da bifurcação dos vasos ilíacos até o nervo hipogástrico, incluindo linfonodos pré-sacrais e retirar o maior número possível de linfonodos.
Deve ser realizada biópsia de congelação da margem uretral. Caso negativa, pode ser realizada sua preservação para reconstrução urinária com reservatório de urina interno (ortotópico) e sem necessidade de uso de bolsa coletora de urina.
Como a bexiga é retirada completamente, na grande maioria dos casos, há necessidade do uso de segmento de intestino delgado para confecção do reservatório de urina (Neo-bexiga ileal) ou para conduzir a urina para o exterior do corpo (Reconstrução urinária tipo Bricker). Cada tipo de reconstrução tem suas particularidades, complicações, vantagens e desvantagens que devem ser discutidas e explicadas caso a caso com a equipe cirúrgica.
Câncer de Bexiga Invasor e Quimioterapia
Pode ser realizada antes da Cistectomia, chamando-se quimioterapia Neo-adjuvante, baseando-se no medicamento Cisplatina e está indicada nos tumores invasores sem doença detectada à distância (T2-T4) nos exames de imagem. Mostrou-se importante e aumenta a sobrevida livre de doença e taxa de cura neste grupo (doença ainda localizada na bexiga).
A quimioterapia adjuvante é realizada após a cistectomia, sempre que forem detectados gânglios acometidos pelo tumor em análise anatomopatológica do material obtido durante a cirurgia. Ou associada com radioterapia no caso de margens cirúrgicas comprometidas pelo tumor.
A quimioterapia paliativa deve ser realizada nos casos de doença com acometimento sistêmico (disseminado), com intuito de aumentar a sobrevida.
Existem protocolos promissores com imunoterapia, devendo cada caso ser avaliado e acompanhado conjuntamente com a Oncologia Clínica.
Referência:
https://www.auanet.org/guidelines/bladder-cancer-non-muscle-invasive-guideline
https://www.auanet.org/guidelines/bladder-cancer-non-metastatic-muscle-invasive-guideline
https://www.nccn.org/professionals/physician_gls/default.aspx#bladder
https://www.fcm.unicamp.br/fcm/sites/default/files/2016/page/manual_uroonco_2015.pdf
DeVita, Hellman, and Rosenberg’s Cancer: Principles & Practice of Oncology, 11Th edition